Mato Grosso vem se tornando o estado mais perigoso do país, para o público feminino, possuindo uma margem de aumento de 110% em casos de assédio ou ameaças. No mês de janeiro a junho de 2024, houve registros de mais de 900 casos, de perseguições. Conforme o levantamento da Polícia Civil, durante o primeiro semestre de 2024, 80% dos feminicídios registrados no estado, aconteceram em ambientes domésticos, ou seja, dentro de casa. Além disso, 55% dos casos envolviam o uso de arma branca por parte do agressor. No total, foram mencionados, 20 feminicídios nos primeiros seis meses do ano. Em todos os casos investigados, os agressores foram identificados, e 17 deles foram detidos. Dentre esses, 11 foram capturados em flagrante.
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Em junho, o caso da Bruna, 24 anos, chocou a sociedade mato-grossense, devido à forma brutal a qual foi assassinada. A vítima sofreu ataques, em uma quitinete e logo após a sua morte, teve seu corpo acorrentado em uma motocicleta e foi arrastada por aproximadamente três quadras até uma área de mata, onde foi lançada em uma vala. O caso aconteceu na cidade de Sinop (503 km da capital). O responsável pelo crime foi detido em Nova Maringá, a mais de 300 km da cidade onde os fatos teriam acontecido.
Outro caso que chamou a atenção no primeiro semestre de 2024 foi o de Lorrane Cristina Silva de Lima, 23 anos, que foi encontrada morta em sua residência, ao lado de seus filhos menores, na cidade de Diamantino, (299 km de Cuiabá). Segundo o delegado responsável pelo caso, Marcos Bruzzi, o suspeito teria cometido o crime para utilizar a impressão digital da vítima e desbloquear o celular dela.
No mês de julho, o caso da filha do deputado Gilberto Cattani (PL), deixou a sociedade assustada, devido à brutalidade e a maneira como o crime ocorreu. Raquel Cattani foi brutalmente assassinada, com mais de 30 facadas, dentro de sua residência, a mando do ex-marido. O crime aconteceu na cidade de Nova Mutum (269 km de Cuiabá).
Após a tragédia, o deputado estadual, criou um projeto de lei, que visa garantir o porte e posse de armas, para mulheres sob medida de proteção determinada pela Justiça. O projeto de lei foi aprovado pela Assembléia Legislativa de Mato Grosso (ALMT). No entanto, a proposta, é considerada inconstitucional, uma vez que é competência do Congresso Nacional decidir sobre o porte e a posse de armas pela população. O presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB-MT, Felipe Amorim Reis, esclareceu que, se a lei for promulgada no estado, será responsabilidade da Justiça reconhecer a inconstitucionalidade e revogar a norma.
Segundo o projeto, para ter o direito de possuir uma arma, a mulher precisará passar por avaliações psicológicas, treinamentos e cumprir todos os requisitos, como não ter antecedentes criminais. Essas mulheres estarão proibidas de portar a arma de forma visível e aberta e de ser abordadas sob efeito de álcool ou drogas, ou usá-la para a prática de crimes.
O texto do projeto foi apresentado pela primeira vez em 2022, quando a Comissão de Segurança Pública apoiou a proposta. No entanto, só ganhou destaque novamente após a repercussão do caso de Raquel Cattani.
Para garantir a segurança das vítimas, a Justiça concede medidas protetivas. Conforme estabelecido pela Lei Maria da Penha, essas medidas têm o objetivo de assegurar que todas as mulheres, independentemente de classe social, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, idade, religião ou nível educacional, tenham o direito a uma vida sem violência, protegendo sua saúde física, mental e patrimônio. No entanto, as maiorias dos agressores desrespeitam essas ordens e violam as medidas protetivas. Segundo a Secretaria de Estado de Segurança Pública (SESP), cerca de 930 homens desrespeitaram as ordens judiciais, representando um aumento de 17%.
Em 2023, foram registrados 9.234 casos de ameaças, enquanto em 2024 houve 9.221 ocorrências, representando uma redução de 0,1%. Além disso, os casos de lesões corporais apresentaram uma queda de 10%. No cenário da capital, Cuiabá, registrou mais de 723 casos de lesão corporal e 18 casos de assédio, constrangimento, humilhação, perseguição ou ameaça, por qualquer meio. Isso representa um aumento de aproximadamente 200% em comparação com períodos anteriores.
A equipe do Jornal Centro Oeste Popular teve acesso exclusivo a uma vítima de violência doméstica, que compartilhou com detalhes o que aconteceu.
Rosemeire Silva, 42 anos, relata que sofreu violência domestica durante o seu primeiro casamento e que devido ao trauma, desencadeou diversos problemas psicológicos e inseguranças.
“Sofri violência doméstica no meu primeiro e único casamento, porque depois disso, não consegui construir uma família por medo de passar novamente por momentos ruins. Tornei-me uma mãe solteira, ou como chamam atualmente de 'mãe solo'. Tudo começou depois que anunciei minha gravidez, que até então era desejada por nós dois. Mas, infelizmente, não foi bem aceita. As brigas eram sempre envolvidas por traição, bebidas e drogas. Até o dia em que um dente meu foi arrancado por um murro. Chamei a polícia e fomos para delegacia, mas para minha surpresa, o delegado, um homem, questionou se eu gostaria de seguir com o processo, pois, daria muito trabalho para depois desistir e continuar o relacionamento. Orientou que fosse para casa, acalmasse e voltasse para minha família. Nunca mais voltei em uma delegacia, o que é altamente constrangedor e decidi seguir a vida criando minha filha, estudando e não mais me relacionando com alguém. Separei logo em seguida e nunca mais voltei com o ex-marido. De lá para cá a legislação mudou muito, pois, 20 anos já se passaram. O acesso está melhor, mas entre a teoria, lei e a prática ainda tem muito a evoluir”, comenta Rosemeire.
Durante a apuração de dados, tivemos um bate-papo com a delegada Judà Marcondes, que atua na Delegacia Especializada de Defesa da Mulher (DEDM) de Cuiabá, e fala sobre o procedimento correto para fazer, nessas situações.
“Não é fácil romper com o ciclo de violência, uma vez que o medo, a vergonha, a dependência emocional e econômica são vetores determinantes e dificultam o rompimento com o ciclo de violência. Após o registro criminal, é muito importante que a vítima procure ajuda psicológica. O procedimento correto que a mulher precisa adotar ao sofrer agressões físicas ou verbais é se afastar do agressor, preservar as provas e se deslocar a delegacia para registrar ocorrência, e solicitar medidas protetivas de urgência, com intuito de afastar o agressor do lar, proibi-ló de entrar em contato com a vítima, retirar a arma de fogo de sua posse, proibir de frequentar determinados locais que coincidam com os frequentados pela vítima. Em Cuiabá, há uma casa de Amparo com atribuição de acolher mulheres que sofram violência doméstica e não tenham local seguro para permanecer. A casa de Amparo é um local seguro e sigiloso o qual oferece apoio temporário, concedendo suporte psicológico, assistencial e educacional. A delegacia da mulher encaminha mulheres nesta condição com intuito de trazer esse eixo de proteção; os filhos que presenciam a violência sofrem consequências psicológicas, emocionais e comportamentais, os quais podem reproduzir na fase adulta as condutas vivenciadas. Assim, não permitir que os filhos vivenciem a violência doméstica é fundamental para mudança cultural de nossa sociedade, produzindo uma sociedade mais justa e saudável”, finaliza Judà Marcondes.
A Polícia Civil de Mato Grosso conta atualmente com oito Delegacias Especializadas de Defesa da Mulher, localizadas na capital e em outras regiões do estado. Além disso, há um Plantão 24 horas em Cuiabá, dedicado ao atendimento de vítimas de violência doméstica e sexual.
Serviços:
Unidades de Atendimento à Mulher:
Cuiabá (região metropolitana)
Plantão 24h de Atendimento a Vítimas de Violência Doméstica e Sexual
Endereço: Av. Dante Martins de Oliveira, s/n, Bairro Planalto
Tel.: (65) 3901-4254 / 3901-4229
Delegacia Especializada de Defesa da Mulher de Cuiabá (DEDM Cuiabá)
Funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Av. Carmindo de Campos, 2109, Jardim Paulista
Tel.: Recepção (65) 3901-4277 / Cartório Central (65) 3901-5344
Nota: Equipe plantonista noturna para casos de estupro.
Várzea Grande (região metropolitana)
Delegacia Especializada de Defesa da Mulher, da Criança e do Idoso
Funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua Almirante Barroso, 298, Centro Sul
Tel.: (65) 3685-1236 / 3685-2838 / 3685-8197
Rondonópolis (região sudeste)
Delegacia Especializada de Defesa da Mulher
Funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua Armando Farjado, 372, Vila Aurora
Tel.: (66) 3423-1133 / 3423-1754
Barra do Garças (região leste)
Delegacia Especializada de Defesa da Mulher
Funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua Carajás, 1156, Centro
Tel.: (66) 3401-1388
Cáceres (região oeste)
Delegacia Especializada de Defesa da Mulher
Funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Av. General Osório, 1084, Centro
Tel.: (65) 3223-5257 / 3224-1160
Sinop (região norte)
Delegacia Especializada de Defesa da Mulher, Criança, Adolescente e Idoso
Funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua Colonizador Ênio Pepino, 3061, Setor Industrial Sul
Tel.: (66) 3531-3544 / 3531-0120
Tangará da Serra (região médio-norte)
Delegacia Especializada de Defesa da Mulher
Funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Avenida Brasil, esquina com Av. Vinte e Oito, 62E, Centro
Tel.: (65) 3325-3413
Primavera do Leste (região sul)
Delegacia Especializada de Defesa da Mulher, Criança e Idoso
Funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua Lajes, 961, Bairro Primavera IV
Tel.: (65) 3901-4254 / 3901-4229
Além dessas unidades, 21 delegacias municipais no interior do estado possuem Núcleos de Atendimento à Mulher, com equipes policiais femininas e ambientes exclusivos para atendimento de vítimas de violência.
Ferramentas Virtuais:
Delegacia Virtual: permite o pré-registro de ocorrências de violência doméstica (www.delegaciavirtual.mt.gov.br).
SOS Mulher MT: aplicativo que permite o acionamento rápido de ajuda em casos de violência doméstica, com integração ao sistema de proteção em cidades como Cuiabá, Várzea Grande, Cáceres e Rondonópolis (https://sosmulher.pjc.mt.gov.br).
As vítimas de violência são atendidas por profissionais especializados que podem elaborar pedidos de medidas protetivas e encaminhá-las para redes de apoio, como órgãos municipais, instituições de atendimento psicossocial e programas de reeducação para agressores. A Patrulha Maria da Penha também atua na fiscalização das medidas protetivas em todo o estado. A expansão e aprimoramento dessas políticas para o interior do estado são prioritárias para garantir maior proteção e justiça às mulheres vítimas de violência.