21 de Novembro de 2024

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GERAL Quarta-feira, 20 de Novembro de 2024, 08:21 - A | A

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MOVIMENTO NEGRO

Consciência Negra: A luta por igualdade e respeito que não acaba em novembro

O movimento negro no Brasil surgiu durante a escravidão para resistência às violências dos senhores. Com o tempo, fortaleceu-se e conquistou avanços para a comunidade negra, cujas injustiças históricas ainda reverberam na sociedade contemporânea.

Ana Carolina Guerra | Redação

O movimento negro no Brasil tem suas raízes no período escravagista, quando começou de forma precária e clandestina, com negros se insurgindo contra o sistema opressor. Lideranças como Zumbi dos Palmares, que comandou o Quilombo dos Palmares, se tornaram símbolos de resistência. Além disso, os escravizados adotaram formas de luta como a quilombagem (fuga para os quilombos) e o bandoleirismo (guerrilhas contra povoados e viajantes) para enfrentar a escravidão.

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A luta pela abolição da escravidão ganhou força com o Movimento Liberal Abolicionista, que defendia o fim do tráfico de escravizados e a emancipação dos negros. Essa luta culminou na promulgação da Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, que aboliu a escravidão no Brasil. No entanto, com o fim da escravidão, a população negra enfrentou um novo desafio: a luta contra o preconceito e a desigualdade social, problemas que perduram até hoje.

No final do século XIX e ao longo do século XX, surgiram jornais e revistas voltados à população negra, fundados por diversas associações, desde carnavalescas até literárias. Inicialmente voltados para discutir temas da cultura negra, esses periódicos logo se tornaram plataformas de denúncia contra a desigualdade racial e a discriminação, dando origem à chamada Imprensa Negra Paulista. Logo em 1931, foi criada a Frente Negra Brasileira, que mais tarde se transformaria em partido político, mas seria extinta com a criação do Estado Novo. Após o fim desse regime, entidades como a União dos Homens de Cor e o Teatro Experimental do Negro continuaram a luta pelos direitos dos negros.

Nas décadas de 1960 e 1970, o movimento negro brasileiro se influenciou por movimentos internacionais, como o Movimento dos Direitos Civis nos Estados Unidos e as lutas contra o apartheid na África do Sul. Personalidades como Rosa Parks, Martin Luther King, Nelson Mandela e Abdias Nascimento se tornaram referências para a luta no Brasil, enquanto o movimento “Black is Beautiful” também se espalhava.

Nos anos 70 e 80, o movimento negro brasileiro se fortaleceu com a formação de grupos organizados, como o Movimento Negro Unificado (MNU), que surgiu em 1978 em meio à ditadura militar. O MNU teve como principais pautas o fim da discriminação racial e o combate à violência policial, ao racismo nos meios de comunicação, no mercado de trabalho e no regime militar. Sua primeira grande manifestação ocorreu em frente ao Teatro Municipal de São Paulo, reunindo milhares de pessoas. Desde sua criação, o MNU alcançou importantes vitórias, como a formulação de demandas para a Constituição de 1988, a criação do Dia Nacional da Consciência Negra (20 de novembro), a demarcação de terras quilombolas e a implementação da Lei 10.639, que torna obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira nas escolas.

Outras conquistas do movimento incluem a criação da Lei de Cotas nas universidades e a Lei n.º 7.716, que define como crime a discriminação racial. Zumbi dos Palmares também foi reconhecido como herói nacional, em uma ação simbólica para reforçar a luta e o legado da resistência negra.

Após a abolição da escravidão, a população negra no Brasil passou a viver em guetos e comunidades isoladas, muitas vezes para proteção e devido à falta de oportunidades. Desde então, a luta tem sido para reparar os danos causados pela escravidão, buscando compensações pelos anos de trabalho forçado e pela exclusão social persistente. As principais reivindicações incluem a implementação de políticas públicas que garantam maior presença de negros no mercado de trabalho e no sistema educacional, além da aplicação efetiva das leis que criminalizam o racismo e promovem a aceitação da cultura afro-brasileira.

A luta jurídica contra o racismo no Brasil começou com a Lei Afonso Arinos (1951), que proibia a discriminação racial, mas teve pouca eficácia devido à falta de aplicação das punições. Em 1989, a Lei Caó (Lei 7.716) foi um marco, tipificando o racismo como crime imprescritível e inafiançável, além de incluir a injúria racial (Art. 140, CP) como crime. Para promover a inclusão da população negra, a Lei 12.711/12 estabeleceu cotas nas universidades públicas e a Lei 12.990/14 determinou que 20% das vagas em concursos públicos sejam destinadas a candidatos negros.

No entanto, a implementação do sistema de cotas gerou polêmica no Brasil. Muitos opositores argumentam que as cotas são inconstitucionais, uma posição compartilhada por alguns juristas e juízes. Com isso, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem reafirmado sua constitucionalidade, reconhecendo que as cotas são uma medida necessária para combater as desigualdades históricas enfrentadas pela população negra no país.

Além das questões, envolvendo as cotas, o racismo continua a ser um problema persistente na sociedade brasileira, com manifestações tanto explícitas quanto veladas. Casos de insultos racistas contra jogadores de futebol nos estádios, ataques nas redes sociais contra figuras públicas como a jornalista Maria Júlia Coutinho, e o preconceito enfrentado por estudantes negros devido ao seu cabelo, são apenas alguns exemplos de como o racismo continua a afetar o cotidiano da população negra no Brasil, um país que se orgulha de sua diversidade cultural e étnica.

Mesmo com políticas públicas que visam garantir o direito do negro, diversas pessoas praticam o ato, mesmo sabendo que é crime e pode levar à prisão. A jovem paulistana Ana Carolina, 20 anos, conta que sempre sofreu racismo na sociedade, mas aos 15 anos, passou por uma situação extremamente delicada.Ana conta que a situação iniciou em uma escola particular, da cidade de Nova Mutum, onde os colegas, professores e coordenadores direcionavam atos e falas racistas para ela. Durante as aulas, colegas faziam bullying, excluíam das tarefas em grupos e riam quando viam que ela estava entrando na sala de aula.

Em um dos dias normais na semana, a jovem, teve uma crise de ansiedade, onde acabou ficando desacordada e abaixando a cabeça durante a aula de matemática. Quando a professora percebeu a situação, direcionou-se a mesa da aluna e bateu fortemente perto de sua cabeça. Neste dia, a estudante, saiu correndo para a direção e contou o que estava acontecendo e se deparou com uma cena delicada. A coordenadora na época questionou Ana e perguntou se o racismo e bullying, não estavam sendo causados, por ela e que talvez desse motivo para os atos.

“Recordo muito bem desse dia, como se fosse hoje. Busquei apoio em alguém que deveria ser profissional e resolver a situação, mas que piorou ao tentar-me culpabilizar. Assim que pude, voltei para casa, contei a minha mãe e pedi que me retirasse da escola imediatamente, pois, não conseguiria estudar no local. O racismo sempre esteve presente em minha vida, mas naquele dia, tive a certeza do quanto isso dói e causa traumas irreversíveis em nossas vidas”, comenta.

Em busca de combater esse crime, garantir um reconhecimento histórico e buscar cada vez mais por direitos iguais, na década de 71, um grupo de jovens negros de Porto Alegre, o Grupo Palmares, propôs o 20 de novembro, dia da morte de Zumbi dos Palmares, como uma data para refletir sobre a luta dos negros e questionar o 13 de maio, data da assinatura da Lei Áurea. Essa iniciativa deu origem ao Dia Nacional da Consciência Negra.

Após décadas de mobilização, em 2017, o Senado aprovou um projeto para tornar o 20 de novembro feriado nacional, mas a desigualdade racial continua presente no Brasil, com os negros enfrentando desafios como desemprego, violência e sub-representação política. O movimento negro também busca reparação histórica e maior representatividade em cargos públicos.

O Grupo Palmares foi fundamental ao rejeitar a liberdade “concedida” pela Lei Áurea e buscar uma liberdade conquistada. O Dia da Consciência Negra ganhou visibilidade com o apoio do Movimento Negro Unificado (MNU), tornando-se um marco da resistência anti-racista.

A Lei 10.639/03 de 2003 tornou obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira nas escolas, e a data foi oficializada como o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra em 2011. No entanto, a luta por igualdade racial ainda enfrenta grandes obstáculos, como a sub-representação política e a exclusão social da população negra, que, apesar de representar mais de 50% da população brasileira, ocupa apenas 27% das vagas legislativas. A educação anti-racista e a representatividade política são vistas como essenciais para mudar essa realidade.

A luta por reconhecimento e reparação histórica continua, com o movimento negro buscando fortalecer as políticas públicas de igualdade racial e promover o resgate de figuras históricas negras, como Zumbi, Luiz Gama e Dandara.

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